segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Um país cheio de confusões


O estado moçambicano é um estado adolescente. E a adolescência, como se sabe, é aquela fase turbulenta entre a criança que já não está a ser e, ao mesmo tempo, ainda se é, e o adulto que se quer ser, mas que, ao mesmo tempo, ainda não se é. Só pela forma aparentemente ambígua como coloquei o período anterior já dá para imaginar que se trata de uma fase problemática. É uma fase de desafios – e que desafios! Mas se o estado moçambicano é um estado adolescente, a sociedade moçambicana não é pois, seja por meio de uma barriga de aluguel seja por um outro meio, esta é a progenitora daquele. Por isso penso que o problema se encontra na forma como essa sociedade pariu o estado. Como se sabe, só em 1975 é que se anunciou uma república moçambicana, portanto, um estado moçambicano que o seu crescimento, fundamentalmente raquítico e organicamente deficiente, deu-se em duas em fases, todas elas alicerçadas em confusões. Se não me engano, de junho de 1975 a dezembro de 1990 essa República era, na verdade, uma República Popular. No que se fundamentava? Resposta: fundamentava-se basicamente numa interpretação deturpada da história de um país e de uma sociedade inteiros. Esta interpretação consistiu, fundamentalmente, numa separação perplexa e esquizofrénica entre uns seres iluminados e outros seres das trevas, portanto, não iluminados. Contudo, com base nessa separação acreditava-se que os primeiros conheciam bem os segundos, sabiam do que era importante para eles e para todos e qual deveria ser o destino daqueles rebanhos recentemente saídos da opressão colonial, mas, acreditava-se, ainda seres do/no obscurantismo e das/nas trevas que necessitavam de guia. As consequências disso tudo já se sabe, seja porque se viveu ou se leu seja porque se ouviu ao redor da fogueira ou porque se pesquisou. Só confusões. Entretanto, de dezembro de 1990 até os dias de hoje, até o momento de agora, outubro de 2019, bem no momento em que as eleições recentemente terminadas foram uma porcaria (e como sempre foram, coisa própria de "Um país cheio de confusões"!), a República deixou de ser popular para se tornar apenas numa "República de Moçambique". Que sonho bom! Espero continuarmos a sonhar... e a viver. Mas, de novo confusões! Para começar do começo,ta esta república se pariu entre guerras e acordos e foi crescendo, e está crescendo, apesar de como um deficiente visual e mental, entre guerras e acordos e mais guerras e acordos entre entidades que, de novo, sempre se posicionaram como conhecedoras do destino de uma sociedade inteira reduzindo toda a complexidade desta sociedade, para emprestar um estilo da Dulce Passades, ao simples "nossismo", “euismo” ou, já cá para mim, a simples imbecilidades. Daí mais confusões. A bipolarização política, a pequenez do debate na esfera pública caraterizado por uma falta de respeito pelas posições e pensamentos contrários, pelas vidas das pessoas e, para além disso, a falta de sensibilidade política, a nossa incapacidade de viver em zoológicos como animais políticos estão, como sempre estiveram desde os primeiros momentos após o parto, atreladas em confusões de um lado para o outro – compatriotas, eis aí o país com cheio de confusões! São confusões que se exibe a luz do dia, sem vergonha e nem receio, pelos homens com barbas e tudo, pelas mulheres com seios e tudo e por outros homens com batinas e tudo. Toda a confusão que se vê nas recentes eleições e que assombram tanto os espíritos pérola indianos, só é novidade para quem não conhece o país porque nem se conhece a ele mesmo. Para falar de forma nietzschiana, há algo de fundamental nesse problema todo que ainda nem se quer desejamos alcançar! Os ataques corriqueiros que se assiste nas redes sociais, por exemplo, revelam o país que somos e, porque não poderia ser diferente, as lideranças que merecemos. É isso. Tudo o resto é apenas cobardia, estupidez, miopia, imbecilidade, idiotice, visões de vulto, perplexidade e um falso, mas corriqueiro e enervante, sentimento de superioridade moral de toneladas de moçambicanos na esfera pública. Somos "um país cheio de confusões"..., mas nós os outros sabemos – já agora, que venham os insultos! – Que é apenas próprio da idade de um país como o nosso e da doença de uma sociedade que ainda não se viu infantil, doente mental, deficiente visual e, talvez, como escrevi num texto de 2016, uma "sociedade de matanje de areia".



Prontos, desabafei!

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