O estado moçambicano é um estado adolescente. E a
adolescência, como se sabe, é aquela fase turbulenta entre a criança que já não
está a ser e, ao mesmo tempo, ainda se é, e o adulto que se quer ser, mas que,
ao mesmo tempo, ainda não se é. Só pela forma aparentemente ambígua como
coloquei o período anterior já dá para imaginar que se trata de uma fase
problemática. É uma fase de desafios – e que desafios! Mas se o estado
moçambicano é um estado adolescente, a sociedade moçambicana não é pois, seja
por meio de uma barriga de aluguel seja por um outro meio, esta é a progenitora
daquele. Por isso penso que o problema se encontra na forma como essa sociedade
pariu o estado. Como se sabe, só em 1975 é que se anunciou uma república
moçambicana, portanto, um estado moçambicano que o seu crescimento, fundamentalmente
raquítico e organicamente deficiente, deu-se em duas em fases, todas elas
alicerçadas em confusões. Se não me engano, de junho de 1975 a dezembro de 1990
essa República era, na verdade, uma República Popular. No que se fundamentava? Resposta:
fundamentava-se basicamente numa interpretação deturpada da história de um país
e de uma sociedade inteiros. Esta interpretação consistiu, fundamentalmente,
numa separação perplexa e esquizofrénica entre uns seres iluminados e outros seres
das trevas, portanto, não iluminados. Contudo, com base nessa separação
acreditava-se que os primeiros conheciam bem os segundos, sabiam do que era
importante para eles e para todos e qual deveria ser o destino daqueles rebanhos
recentemente saídos da opressão colonial, mas, acreditava-se, ainda seres do/no
obscurantismo e das/nas trevas que necessitavam de guia. As consequências disso
tudo já se sabe, seja porque se viveu ou se leu seja porque se ouviu ao redor
da fogueira ou porque se pesquisou. Só confusões. Entretanto, de dezembro de 1990 até os dias de hoje,
até o momento de agora, outubro de 2019, bem no momento em que as eleições
recentemente terminadas foram uma porcaria (e como sempre foram, coisa própria
de "Um país cheio de confusões"!), a República deixou de ser popular
para se tornar apenas numa "República de Moçambique". Que sonho bom! Espero
continuarmos a sonhar... e a viver. Mas, de novo confusões! Para começar do
começo,ta esta república se pariu entre guerras e acordos e foi crescendo, e está
crescendo, apesar de como um deficiente visual e mental, entre guerras e
acordos e mais guerras e acordos entre entidades que, de novo, sempre se
posicionaram como conhecedoras do destino de uma sociedade inteira reduzindo
toda a complexidade desta sociedade, para emprestar um estilo da Dulce Passades,
ao simples "nossismo", “euismo” ou, já cá para mim, a simples
imbecilidades. Daí mais confusões. A bipolarização política, a pequenez do
debate na esfera pública caraterizado por uma falta de respeito pelas posições
e pensamentos contrários, pelas vidas das pessoas e, para além disso, a falta
de sensibilidade política, a nossa incapacidade de viver em zoológicos como
animais políticos estão, como sempre estiveram desde os primeiros momentos após
o parto, atreladas em confusões de um lado para o outro – compatriotas, eis aí
o país com cheio de confusões! São confusões que se exibe a luz do dia, sem
vergonha e nem receio, pelos homens com barbas e tudo, pelas mulheres com seios
e tudo e por outros homens com batinas e tudo. Toda a confusão que se vê nas
recentes eleições e que assombram tanto os espíritos pérola indianos, só é
novidade para quem não conhece o país porque nem se conhece a ele mesmo. Para
falar de forma nietzschiana, há algo de fundamental nesse problema todo que ainda
nem se quer desejamos alcançar! Os ataques corriqueiros que se assiste nas
redes sociais, por exemplo, revelam o país que somos e, porque não poderia ser diferente, as lideranças que merecemos. É isso. Tudo o resto é apenas cobardia,
estupidez, miopia, imbecilidade, idiotice, visões de vulto, perplexidade e um falso,
mas corriqueiro e enervante, sentimento de superioridade moral de toneladas de
moçambicanos na esfera pública. Somos "um país cheio de confusões"...,
mas nós os outros sabemos – já agora, que venham os insultos! – Que é apenas
próprio da idade de um país como o nosso e da doença de uma sociedade que ainda
não se viu infantil, doente mental, deficiente visual e, talvez, como escrevi
num texto de 2016, uma "sociedade de matanje de areia".
Prontos, desabafei!
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